Categoria: Direito Imobiliário

Condomínios Edilícios Residenciais Podem Proibir Locação de Unidade Autônoma via Airbnb? Precedente do STJ

artigo arthur locação

Amigo (a)(s) Leitor (a)(es), este artigo versará acerca da possibilidade ou não dos Condomínios Edilícios Residenciais proibirem a locação das unidades autônomas através da plataforma Airbnb. Inclusive, farei menção ao precedente recentíssimo do Superior Tribunal de Justiça (STJ) tratando sobre essa matéria.

Primeiramente, faz-se necessário mencionar o ponto fundamental dessa matéria, isto é, qual é a natureza desse negócio jurídico? Há basicamente 02 (duas) correntes, a 1ª (primeira) corrente entende que a locação se caracteriza como locação para temporada, cuja locação está disciplinada nos arts. 48 a 50 da Lei do Inquilinato (Lei nº 8.245/1991) e a 2ª (segunda) corrente inferi que essa locação trata-se de um contrato atípico de hospedagem e, por conseguinte, tem a finalidade não residencial.

Apresentada a tese das 02 (duas) correntes, importante dizer que nas convenções dos condomínios residenciais há uma cláusula padrão, estabelecendo que a finalidade das partes comuns e privativas é residencial, de modo que se o entendimento adotado for o da 1ª (primeira) corrente, o negócio jurídico é válido, visto que locação para temporada tem a finalidade residencial. No entanto, se for utilizada a tese da 2ª (segunda) corrente, o negócio será inválido, eis que o contrato atípico de hospedagem tem destinação comercial.

Destarte, antes de mencionar o julgado recentíssimo da Corte Cidadã atinente a esta matéria, julgo importante apresentar abaixo 02 (dois) acórdãos divergentes, cada um adotando as teses divergentes, vejamos:

1ª CORRENTE:

“APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE NÃO FAZER. CONDOMÍNIO. LOCAÇÃO POR TEMPORADA. SENTENÇA DE PARCIAL PROCEDÊNCIA PARA CONDENAR A PARTE RÉ A SE ABSTER DE UTILIZAR SUA UNIDADE DE FORMA NOCIVA E DE FORMA COMERCIAL/NÃO RESIDENCIAL DIVERSA DA PERMITIDA NA CONVENÇÃO. RECURSO DA PARTE RÉ(…). Cuida-se, em síntese, de ação de obrigação de não fazer c/c pedido de tutela de urgência na qual o Condomínio Autor pretende que o Réu/Apelante, cesse as locações por meio de hospedagem on-line, através de plataformas digitais tais como o ‘AirBnb’, argumentando que a mesma tem finalidade comercial, em descumprimento ao previsto na Convenção do Condomínio. Defende que o Demandado vem fazendo uso indevido da propriedade, desvirtuando a sua natureza, contrariando assim o disposto no regimento interno. Como cediço, entre os direitos do proprietário, está o direito de usufruir o bem, inclusive locando a terceiros, por temporada, não podendo tal direito ser limitado pela Convenção nem pelo Regimento Interno do Condomínio, sob pena de indevida interferência e restrição no direito exclusivo de propriedade do condômino sobre a sua unidade residencial. Dentre as prerrogativas dos titulares do domínio, insere-se a de locar, ou mesmo dar em comodato, bem imóvel. O que é indissociável do direito de propriedade. Inteligência dos arts. 1.228 e 1.335 do Código CivilDeve ser esclarecido que as locações levadas a efeito pela apelante são realizadas através da plataforma on-line conhecida como “Airbnb”, a qual destina-se ao compartilhamento de imóveis e serviços de locação, sendo um canal direto para negócios entre locadores e locatários, de forma simples e rápida, por curtos períodos de tempo. Esse tipo de locação, ao contrário do alegado na inicial, tem natureza de locação por temporada e não de hotelaria/hospedagem, que oferecem serviços como recepção, limpeza, arrumação etc. Locação por temporada encontra previsão legal no artigo 48 da Lei n.º 8.245/1991 e é aquela contratada por prazo não superior a 90 dias (…) PROVIMENTO AO RECURSO.

(TJ-RJ – APL: 00024723320178190079, Relator: Des (a). ANDRE EMILIO RIBEIRO VON MELENTOVYTCH, Data de Julgamento: 06/10/2020, VIGÉSIMA PRIMEIRA CÂMARA CÍVEL, Data de Publicação: 14/10/2020)” (Marcação minha)

2ª CORRENTE:

“CONDOMÍNIO EDILÍCIO – Ação de anulação de ata de assembleia geral ordinária de instalação de condomínio c.c. obrigação de não fazer, proposta por condômino contra condomínio, buscando obstá-lo de impedir locação de seu imóvel através de plataformas de hospedagem, julgada improcedente – Segundo a convenção o condomínio possui natureza exclusivamente residencial – Convenção condominial que é dotada de força cogente e obriga a toda a coletividade condominial, devendo os condôminos se comportar com respeito e obediência a ela – Locação de unidades condominiais por temporada através de plataforma de hospedagens online (airbnb, booking e afins) – Situação que se assemelha à hotelaria/hospedaria – Característica não residencial – Hipótese em que a verba honorária deve ser arbitrada por apreciação equitativa, ante o valor dado à causa – Sentença mantida – Recurso improvido.

(TJ-SP – AC: 11061086620198260100 SP 1106108-66.2019.8.26.0100, Relator: Caio Marcelo Mendes de Oliveira, Data de Julgamento: 05/05/2021, 32ª Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 05/05/2021)” (Marcação minha)

Finalmente, em 20/04/2021 esse tema tão controvertido foi enfrentado pela 4ª Turma do STJ, ficou assim decidido:

DIREITO CIVIL. RECURSO ESPECIAL. CONDOMÍNIO EDILÍCIO RESIDENCIAL. AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE NÃO FAZER. LOCAÇÃO FRACIONADA DE IMÓVEL PARA PESSOAS SEM VÍNCULO ENTRE SI, POR CURTOS PERÍODOS. CONTRATAÇÕES CONCOMITANTES, INDEPENDENTES E INFORMAIS, POR PRAZOS VARIADOS. OFERTA POR MEIO DE PLATAFORMAS DIGITAIS ESPECIALIZADAS DIVERSAS. HOSPEDAGEM ATÍPICAUSO NÃO RESIDENCIAL DA UNIDADE CONDOMINIAL. ALTA ROTATIVIDADE, COM POTENCIAL AMEAÇA À SEGURANÇA, AO SOSSEGO E À SAÚDE DOS CONDÔMINOS. CONTRARIEDADE À CONVENÇÃO DE CONDOMÍNIO QUE PREVÊ DESTINAÇÃO RESIDENCIAL. RECURSO IMPROVIDO. 1. Os conceitos de domicílio e residência (CC/2002, arts. 70 a 78), centrados na ideia de permanência e habitualidade, não se coadunam com as características de transitoriedade, eventualidade e temporariedade efêmera, presentes na hospedagem, particularmente naqueles moldes anunciados por meio de plataformas digitais de hospedagem. 2. Na hipótese, tem-se um contrato atípico de hospedagem, que se equipara à nova modalidade surgida nos dias atuais, marcados pelos influxos da avançada tecnologia e pelas facilidades de comunicação e acesso proporcionadas pela rede mundial da internet, e que se vem tornando bastante popular, de um lado, como forma de incremento ou complementação de renda de senhorios, e, de outro, de obtenção, por viajantes e outros interessados, de acolhida e abrigo de reduzido custo. 3. Trata-se de modalidade singela e inovadora de hospedagem de pessoas, sem vínculo entre si, em ambientes físicos de estrutura típica residencial familiar, exercida sem inerente profissionalismo por aquele que atua na produção desse serviço para os interessados, sendo a atividade comumente anunciada por meio de plataformas digitais variadas. As ofertas são feitas por proprietários ou possuidores de imóveis de padrão residencial, dotados de espaços ociosos, aptos ou adaptados para acomodar, com certa privacidade e limitado conforto, o interessado, atendendo, geralmente, à demanda de pessoas menos exigentes, como jovens estudantes ou viajantes, estes por motivação turística ou laboral, atraídos pelos baixos preços cobrados. 4. Embora aparentemente lícita, essa peculiar recente forma de hospedagem não encontra, ainda, clara definição doutrinária, nem tem legislação reguladora no Brasil, e, registre-se, não se confunde com aquelas espécies tradicionais de locação, regidas pela Lei 8.245/91, nem mesmo com aquela menos antiga, genericamente denominada de aluguel por temporada (art. 48 da Lei de Locações). 5. Diferentemente do caso sob exame, a locação por temporada não prevê aluguel informal e fracionado de quartos existentes num imóvel para hospedagem de distintas pessoas estranhas entre si, mas sim a locação plena e formalizada de imóvel adequado a servir de residência temporária para determinado locatário e, por óbvio, seus familiares ou amigos, por prazo não superior a noventa dias. 6. Tampouco a nova modalidade de hospedagem se enquadra dentre os usuais tipos de hospedagem ofertados, de modo formal e profissionalizado, por hotéis, pousadas, hospedarias, motéis e outros estabelecimentos da rede tradicional provisoria de alojamento, conforto e variados serviços à clientela, regida pela Lei 11.771/2008. 7. O direito de o proprietário condômino usar, gozar e dispor livremente do seu bem imóvel, nos termos dos arts. 1.228 e 1.335 do Código Civil de 2002 e 19 da Lei 4.591/64, deve harmonizar-se com os direitos relativos à segurança, ao sossego e à saúde das demais múltiplas propriedades abrangidas no Condomínio, de acordo com as razoáveis limitações aprovadas pela maioria de condôminos, pois são limitações concernentes à natureza da propriedade privada em regime de condomínio edilício. 8. O Código Civil, em seus arts. 1.333 e 1.334, concede autonomia e força normativa à convenção de condomínio regularmente aprovada e registrada no Cartório de Registro de Imóveis competente. Portanto, existindo na Convenção de Condomínio regra impondo destinação residencial, mostra-se indevido o uso de unidades particulares que, por sua natureza, implique o desvirtuamento daquela finalidade (CC/2002, arts. 1.332, III, e 1.336, IV). 9. Não obstante, ressalva-se a possibilidade de os próprios condôminos de um condomínio edilício de fim residencial deliberarem em assembleia, por maioria qualificada (de dois terços das frações ideais), permitir a utilização das unidades condominiais para fins de hospedagem atípica, por intermédio de plataformas digitais ou outra modalidade de oferta, ampliando o uso para além do estritamente residencial e, posteriormente, querendo, incorporarem essa modificação à Convenção do Condomínio. 10. Recurso especial desprovido.

(STJ. 4º Turma. REsp 1.819.075 / RS. Por maioria. 20/04/2021) (Marcação minha)

Por derradeiro, depreende-se pela leitura do aresto supracitado, cuja decisão é a primeira da Corte Superior, que há uma inclinação para adoção da 2ª Corrente (locação via Airbnb é de natureza não residencial, podendo ser vedado pelos condomínios edilícios residenciais). Porém, é imprescindível aguardar novos julgamentos acerca desta temática, por parte deste Egrégio Tribunal, para que haja o “amadurecimento” da corrente prevalente a ser seguido pela jurisprudência pátria.

Artigo escrito por Arthur Tavares.

Advogado do Escritório Arechavala Advogados.
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Locador usufrutuário ou fiduciário, extinção de usufruto ou fideicomisso, como fica a locação?

Não é raro que o locador não seja o proprietário do bem locado. Isso porque locação é transferência de posse, e não de propriedade. A posse não se confunde com a propriedade, é direito autônomo[1].

A propriedade é o mais amplo poder sobre um bem e abrange, em seu conteúdo, a posse (usar e gozar). Por isso, normalmente associa-se posse com propriedade. Até o próprio legislador de alguma forma complica esse entendimento ao dizer que “Considera-se possuidor todo aquele que tem de fato o exercício, pleno ou não, de algum dos poderes inerentes à propriedade” (art. 1.196 CC).

Mas a posse de um bem não advém somente da propriedade, pode originar (i) de um direito real, como é o usufruto (usar e fruir/gozar); (ii) de um negócio jurídico, o que ocorre no fideicomisso; ou (iii) de um fato, quando uma pessoa simplesmente tem o poder sobre a coisa.

O Enunciado 492, CJF, elucida a questão: “a posse constitui direito autônomo em relação à propriedade e deve expressar o aproveitamento dos bens para o alcance de interesses existenciais, econômicos e sociais merecedores de tutela”. Tanto é que, como adverte Anderson Schreiber, “o Código Civil brasileiro trata da posse antes da propriedade, orientação que reforça a autonomia da posse em relação à propriedade[2]”.

Portanto, o possuidor, mesmo que não seja proprietário, pode alugar o imóvel que se encontra em seu poder, consoante entendimento sumulado pelo TJRJ, no Enunciado 356:

“A validade da locação prescinde da propriedade do bem pelo locador, bastando que ele garanta o exercício da posse direta, desembaraçada, pelo locatário, salvo com relação à comprovação para legitimidade da propositura da ação de despejo, quando deverão ser observadas as exceções legais.”

Por fim, para ratificar, como consequência desse poder locativo, o locador não-proprietário tem legitimidade para demandar ação de despejo, renovatória e revisional – com algumas ressalvas legais[3].

a. Usufruto

Usufruto é um direito real (art. 1.255, IV, CC) e significa o direito de usar e fruir o imóvel alheio sem pagamento ao proprietário. O usufrutuário tem a posse direta, podendo usar, alugar, dar em comodato, e tem legitimidade para ações possessórias.

O nu-proprietário, dono, mantém a posse indireta e os poderes de dispor e reivindicar.

Se o nu-proprietário vender o imóvel, o adquirente tem que respeitar o usufruto, que pode ser vitalício ou por prazo determinado (temporário).

No que tange à transmissibilidade do usufruto, tendo em vista sua natureza personalíssima, o direito finda com o usufrutuário, de modo que é inadmissível a sua transmissão por alienação seja em vida ou por herança (art. 1.393 CC).

As hipóteses de extinção do usufruto estão enumeradas no art. 1.410 CC, de maneiro que, cancelado o usufruto, todos os poderes decorrentes da propriedade serão consolidados em nome do nu-proprietário.

b. Fideicomisso

Fideicomisso é um negócio jurídico, no qual o proprietário deixa um testamento nomeando uma pessoa (herdeiro ou legatário) com a incumbência de transferir o bem para um terceiro ainda não concebido (art. 1.951, e seguintes, CC).

Temos três figuras nesse negócio: (i) o fideicomitente (o testador/proprietário), (ii) o fiduciário (o herdeiro ou legatário incumbido de traspassar o bem) e o (iii) fideicomissário (beneficiário, pessoa ainda não concebida quando do testamento).

Por exemplo, A (fideicomitente) incumbe a B (fiduciário) transferir o imóvel para o primeiro filho de C (fideicomissário).

O professor José Fernando Simão leciona que “será fideicomissária a substituição quando o testador (fideicomitente) nomear um certo herdeiro ou legatário (fiduciário), estabelecendo que este, com o advento de certo termo ou condição, transmita a herança à pessoa ainda não concebida quando da morte do testador (fideicomissário)”. E complementa, “trata-se de modalidade indireta de substituição, pois o fiduciário recebe a herança que será transmitida ao fideicomissário[4]”.

O art. 1.952 CC dispõe que A substituição fideicomissária somente se permite em favor dos não concebidos ao tempo da morte do testador”.

Complementa o § único “Se, ao tempo da morte do testador, já houver nascido o fideicomissário, adquirirá este a propriedade dos bens fideicometidos, convertendo-se em usufruto o direito do fiduciário.”

O fideicomisso se extingue caso o fideicomissário faleça antes do fiduciário, ou antes de realizar-se a condição resolutória do direito deste último; nesse caso, a propriedade consolida-se no fiduciário (herdeiro ou legatário, que serviria de “ponte” para a transmissão da propriedade), nos termos do art. 1.955 do Código Civil – na forma do art. 1.958 CC.

c. Consequências jurídicas no contrato de locação com a extinção do usufruto ou fideicomisso

O dispositivo legal que trata dessa matéria é o art. 7º da lei do inquilinato:

“Nos casos de extinção de usufruto ou de fideicomisso, a locação celebrada pelo usufrutuário ou fiduciário poderá ser denunciada, com o prazo de trinta dias para a desocupação, salvo se tiver havido aquiescência escrita do nuproprietário ou do fideicomissário, ou se a propriedade estiver consolidada em mãos do usufrutuário ou do fiduciário.

Parágrafo único. A denúncia deverá ser exercitada no prazo de noventa dias contados da extinção do fideicomisso ou da averbação da extinção do usufruto, presumindose, após esse prazo, a concordância na manutenção da locação”.

Portanto, extinto o usufruto, o nu-proprietário tem até 90 dias para notificar o locatário e rescindir o contrato. A notificação, feita dentro dos 90 dias, é para desocupação em 30 dias, sob pena de despejo.

Passados esses 90 dias, sem o exercício do direito de rescisão, ele assume a posição contratual de locador, que era do antigo usufrutuário. O prazo de 90 dias conta da averbação de cancelamento do usufruto.

Dessa forma, o locatário, por precaução, deve inserir uma cláusula de vigência no contrato, com anuência do nu-proprietário, para que a locação permaneça em vigor mesmo com o falecimento do usufrutuário.

Esse entendimento é o que melhor se coaduna com a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, a saber:

“AGRAVO INTERNO NOS EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NO AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. LOCAÇÃO PREDIAL. EXTINÇÃO DO USUFRUTO. AÇÃO DE DESPEJO. DIREITO DO NU-PROPRIETÁRIO. ACÓRDÃO EM SINTONIA COM O ENTENDIMENTO FIRMADO NO STJ. (…) 1. A Jurisprudência desta Corte Superior, que possui firme o entendimento no sentido de que: “Ocorrendo a extinção do usufruto, o nu-proprietário reveste-se do pleno domínio do imóvel, estando, portanto, apto a ajuizar ação de despejo em face da locatária”. (STJ, REsp 736.954/MG, Rel. Min. Laurita Vaz, publ. 28/05/2007). (STJ, AgInt nos EDcl no AgInt no AREsp: 1.561.211/SP, Rel. Min Luis Felipe Salomão, publ. 03/08/2020)”

[1] “Reconhece-se, pois, a autonomia existente entre o direito de propriedade e o direito de posse, bem como a expressão econômica do direito possessório como objeto de possível partilha entre os cônjuges no momento da dissolução do vínculo conjugal sem que haja reflexo direto às discussões relacionadas à propriedade formal do bem”. (REsp 1.739.042-SP, Rel. Min. Nancy Andrighi, pub.: 16/09/2020)

[2] Manual de Direito Civil Contemporâneo, Ed. Saraiva, 2ª edição, p. 713..

[3] Exemplo: arts. 47, §2º e 53, II, da Lei 8.245/91

[4] Código Civil Comentado Doutrina e Jurisprudência, Ed. Forense, livro digital, p. 1.521

Escrito por Luis Arechavala
Advogado do Escritório Arechavala Advogados

Lei Nº 8967 de 03 de agosto de 2020

DISPÕE SOBRE A AFIXAÇÃO DE CARTAZES NOS CONDOMÍNIOS EDILÍCIOS, RESIDENCIAIS, COMERCIAIS, CONJUNTOS HABITACIONAIS, MISTOS, ASSOCIAÇÕES RESIDENCIAIS, ASSOCIAÇÕES DE MORADORES E OUTRAS ORGANIZAÇÕES, COM INFORMAÇÕES SOBRE O ATENDIMENTO À MULHERES EM SITUAÇÃO DE VIOLÊNCIA DURANTE O PERÍODO DE ISOLAMENTO SOCIAL, NA FORMA QUE MENCIONA.

O GOVERNADOR DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO
Faço saber que a Assembleia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro
decreta e eu sanciono a seguinte Lei:

Art. 1º – Ficam os condomínios edilícios, residenciais, comerciais, conjuntos habitacionais, mistos, associações residenciais, associações de
moradores e outras organizações, através de seus representantes legais, obrigados a afixarem cartazes com informações sobre os serviços de atendimento às mulheres em situação de violência que estão
em funcionamento durante o período de isolamento social gerado pela
pandemia – COVID 19.

Parágrafo Único – Os cartazes a que se refere o caput deverão ter as medidas mínimas do formato A4 (210mm de largura e 297mm de altura), com texto impresso com letras proporcionais às dimensões da
área do local e do cartaz, e de fácil visualização, contendo os seguintes termos:

Nós estamos em quarentena, os serviços de atendimento às
mulheres NÃO!
Ouviu ou sofreu uma violência?
Ligue 180 (24 horas)
A violência está ocorrendo agora?
Ligue 190
Em caso de estupro, lesão corporal, tentativa de feminicídio e ameaça, as delegacias de atendimento às mulheres seguem em funcionamento.
Para outros casos, registre a ocorrência pelo site:
w w w. p o l i c i a c i v i l r j . n e t . b r / d p a m . p h p
A Defensoria Pública está atendendo casos de violência contra a mulher através do e-mail: nudem.defensoriarj@gmail.com ou telefone (21) 972268267 (capital).
Para outros municípios consulte www.coronavirus.rj.def.br
EM CASO DE DÚVIDAS envie mensagem para 974735876
Comissão de
Defesa dos Direitos da Mulher

Art. 2º – V E TA D O
Art. 3º – O descumprimento ao disposto na presente Lei acarretará:
I – advertência, com notificação dos responsáveis para a regularização
no prazo máximo e improrrogável de trinta dias;
II – multa no valor correspondente a 100 (cem) UFIR em caso de não
regularização dentro do prazo estipulado no inciso I deste artigo.

Art. 4º – Os valores arrecadados através das multas aplicadas em decorrência do descumprimento desta Lei serão aplicados em programas
e campanhas estaduais de prevenção à violência contra a mulher.
Art. 5º – As despesas com a execução da presente lei correrão por
conta das dotações orçamentárias próprias.
Art. 6º – Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação.

Rio de Janeiro, 03 de agosto de 2020
WILSON WITZEL
Governador

Projeto de Lei nº 2491/2020
Autoria dos Deputados: Mônica Francisco, Vandro Família, Franciane
Motta, Carlos Minc, Renata Souza, Dionisio Lins, Martha Rocha, Bebeto, Enfermeira Rejane, Eliomar Coelho, Luiz Paulo, Subtenente Bernardo, Waldeck Carneiro, Marcelo Cabeleireiro, Márcio Canella, Dani
Monteiro, Samuel Malafaia, Flavio Serafini, Alana Passos, Gustavo Tutuca, Jorge Felippe Neto, Renan Ferreirinha, Danniel Librelon, Giovani
Ratinho, Delegado Carlos Augusto, Marina, Marcos Muller, Brazão, Lucinha, Marcelo Dino, Anderson Alexandre, Val Ceasa, Valdecy Da
Saúde, Max Lemos, Capitão Paulo Teixeira.
Aprovada a Emenda da Comissão de Constituição e Justiça.

RAZÕES DE VETO PARCIAL AO PROJETO DE LEI Nº 2491/2020,
DE AUTORIA DOS SENHORES DEPUTADOS MÔNICA FRANCISCO, VANDRO FAMÍLIA, FRANCIANE MOTTA, CARLOS MINC, RENATA SOUZA, DIONISIO LINS, MARTHA ROCHA, BEBETO, ENFERMEIRA REJANE, ELIOMAR COELHO, LUIZ PAULO, SUBTENENTE BERNARDO, WALDECK CARNEIRO, MARCELO CABELEIREIRO, MÁRCIO CANELLA, DANI MONTEIRO, SAMUEL MALAFAIA, FLAVIO SERAFINI, ALANA PASSOS, GUSTAVO TUTUCA,
JORGE FELIPPE NETO, RENAN FERREIRINHA, DANNIEL LIBRELON, GIOVANI RATINHO, DELEGADO CARLOS AUGUSTO, MARINA, MARCOS MULLER, BRAZÃO, LUCINHA, MARCELO DINO, ANDERSON ALEXANDRE, VAL CEASA, VALDECY DA SAÚDE, MAX
LEMOS, CAPITÃO PAULO TEIXEIRA, QUE “DISPÕE SOBRE A AFIXAÇÃO DE CARTAZES NOS CONDOMÍNIOS EDILÍCIOS, RESIDENCIAIS, COMERCIAIS, CONJUNTOS HABITACIONAIS, MISTOS,
ASSOCIAÇÕES RESIDENCIAIS, ASSOCIAÇÕES DE MORADORES E OUTRAS ORGANIZAÇÕES, COM INFORMAÇÕES SOBRE O ATENDIMENTO À MULHERES EM SITUAÇÃO DE VIOLÊNCIA DURANTE O PERÍODO DE ISOLAMENTO SOCIAL, NA FORMA QUE MENCIONA”

Atenção: Clique aqui para baixar o cartaz.

 

Locação de curtíssima temporada em condomínio

O surgimento de plataformas virtuais de compartilhamento de imóveis trouxe novas problemáticas aos condomínios em edificações. O assunto tem gerado polêmicas, a começar pela sua natureza: locação ou hospedagem? Vamos entender um pouco cada um desses contratos.

Locação é definido no Código Civil como cessão pelo uso e gozo, mediante remuneração, podendo o objeto da locação estar com pertenças (mobiliado, no caso de imóvel) (1) ou não. A Lei 8.245/91 que dispõe acerca da locação de imóvel prevê a modalidade de locação por temporada (2) quando a locação do imóvel se dá por período inferior a noventa dias.

Já o contrato de hospedagem tem como dinâmica (i) o alojamento temporário, (ii) a frequência individual, (iii) os serviços e (iv) cobrança de diária (3) . Por serviço não se entende aquele à disposição de todos, existente em muitos condomínios (4), mas sim aquele prestado individualmente ao ocupante. Portanto, o que se observa de grande diferencial entre os dois negócios jurídicos é a individualização do serviço prestado.

Desta forma, dependendo da dinâmica adotada no contrato de curtíssima temporada por aplicativo, estaremos mais próximos ou da locação ou da hospedagem, sendo certo que estamos diante de um novo tipo contratual. Cabe ao operador do Direito, quando da análise de novas relações sociais, não tentar forçar as novas situações a tipos contratuais antigos, que não se prestam a regular corretamente a situação. A tecnologia nos desafia constantemente a este exercício.

Mesmo que se considere contrato de aluguel, a locação por diárias, utilizando-se de plataformas digitais, como o Airbnb, apresenta configuração diferente da locação por temporada prevista na Lei de Locações acima mencionada.

Havendo serviço individualizado (café da manhã, arrumação, limpeza, consertos etc.), a relação estabelecida se assemelhará ao contrato de hospedagem – próprio da rede hoteleira –, mas com ele não se confundindo.

Seja locação ou hospedagem, essa relação tem gerado diversos problemas, principalmente na seara condominial, cujas controvérsias vêm sendo decididas pelos Tribunais de todo o país.

Tem-se que diante da alta rotatividade de pessoas, é necessário ter um maior controle de acesso, de modo a conferir segurança aos demais moradores. Ocorre que nem todo condomínio é capaz de suportar as despesas para a contratação de uma estrutura de controle e segurança.

Além disso, por se tratar de um constante rodízio de locatários/hóspedes, muitas vezes sem saber do perfil e histórico pessoal de cada um, muitos moradores acabam sendo prejudicados, por exemplo, por realização de eventuais festas, algazarras e desrespeito aos bons costumes, atrapalhando o sossego e a saúde dos demais condôminos, infringindo regra do Art. 1.336, IV, do Código Civil.

C.C. Art. 1.336, IV – São deveres do condômino: dar às suas partes a mesma destinação que tem a edificação, e não as utilizar de maneira prejudicial ao sossego, salubridade e segurança dos possuidores, ou aos bons costumes.

Na ponderação de valores fundamentais, o que prevalece nesse caso: faculdade do direito de propriedade (fruição) (5) e a livre iniciativa (6), que têm conotação individual, ou o direito à saúde, segurança e sossego, com um viés mais coletivo? Essa análise deve ser feita de acordo com a especificidade de cada caso concreto.

Nessa seara, com base na proteção desses três pilares, o Desembargador Juarez Fernandes Folhes, da 14ª Câmara Cível do TJRJ, considerou válida a decisão da assembleia de condomínio que limitou a locação por temporada de imóveis ao prazo mínimo de trinta dias, bem como habitação máxima de seis pessoas por unidade. Vejamos a fundamentação:

É lícito ao proprietário emprestar a sua unidade, ocupá-la pelo número de pessoas que julgar conveniente, seja a título gratuito ou oneroso, não cabendo ao condomínio regular esta prática, salvo se a mesma estiver interferindo na rotina do prédio, ou seja, causando perturbação ao sossego e segurança ou estiver desviando a finalidade do prédio. No caso, a autora confessa que o apartamento foi alugado 22 vezes no ano. Portanto, restou reconhecido que utiliza sua unidade como se fosse um hotel de alta rotatividade de pessoas, o que por certo, em razão da grande quantidade de pessoas estranhas no condomínio, causa insegurança aos demais condôminos (…). O abalo ao sossego e segurança restou comprovado no relato prestado pelo condomínio, através de sua síndica, no termo circunstanciado da 13ª Delegacia de Polícia, que ocasionou em trâmite perante o 4º Juizado Especial Criminal do Leblon (…). A locação por diária, que vem ocorrendo por meio de sites especializados, vem representando efetivamente uma concorrência aos apart-hotéis, flats e similares, e, por isso, desvia a finalidade do edifício residencial, trazendo inclusive encargos extra à portaria, principalmente quanto à segurança.

(TJRJ – 0486825-49.2015.8.19.0001 – 16.07.17)

O Ministro Luis Felipe Salomão, do STJ, quando do voto no julgamento do REsp 1.819.075/RS, que encontra-se suspenso por pedido de vista, assim se manifestou:

A atividade não é caracterizada como comercial e, na ausência de lei que limita tal comportamento, não pode o condômino ser proibido de locar imóvel ou parte dele por curto período. [Acrescentou ainda que] é ilícita a prática de privar o condômino do regular exercício de direito de propriedade em sua vertente de exploração econômica. O uso regular da propriedade em inseparável análise da função social permite concluir pela possibilidade de exploração econômica do imóvel. [Diante da controvérsia instaurada, assentou que] o eixo principal é a defesa do direito de propriedade, desde que respeitadas as regras do condomínio, o sossego e a saúde dos demais condôminos.

Nota-se do referido voto a dificuldade de classificar essa atividade, que, conforme o magistrado, afastou a atividade comercial, mas não conseguiu colocá-la como atividade de locação. Bem ponderou que a ausência de regulamentação específica dessa nova modalidade gera problemas aos julgadores.

Destaca-se, finalmente, a existência do recente Projeto de Lei 2474/2019, de relatoria do Senador Ângelo Coronel (PSD-BA), cujo objetivo é regulamentar a locação de imóveis residenciais por temporada, feita através de aplicativos. A principal regulamentação é a de somente permitir a prática dessa atividade em condomínios edilícios se houver consentimento de 2/3 dos condôminos, por assembleia ou na convenção.

Conclui-se, portanto, que o direito deve acompanhar os avanços tecnológicos, sob pena de se tornar ineficaz. Vale ressaltar a necessidade de regulamentação para a prática dessa atividade, de modo a conferir segurança jurídica a todas as partes, inclusive terceiros.

Enquanto a questão não é definida pelos Tribunais Superiores, entendemos que os condomínios têm o direito de se autorregulamentar por meio da convenção para evitar abusos, resguardar direitos dos condôminos e fornecer ao síndico ferramentas para administração do condomínio.

Por fim, importante ressaltar que a questão deve ser debatida em assembleia para resolver problemas pontuais – por exemplo, a proibição de uma determinada unidade que cause incômodo aos demais pela alta rotatividade. Nestas hipóteses, deverá o síndico, se tiver poderes na convenção, multar a unidade infratora. Caso não haja essa previsão, só poderá multar com autorização da assembleia, com quórum qualificado de 2/3 dos condôminos (CC, Art. 1.336 §2º) (7).

Dessa forma, a convenção de condomínio é o instrumento hábil para regulamentar tal atividade em condomínios edilícios, seja proibindo ou permitindo, ou mesmo determinar a forma de permissão, cujo quórum para a inclusão da referida norma regulamentadora é de 2/3 dos condôminos.

 

Artigo escrito por Ioná Cytrynbaum, Luis Arechavala e Francisco Egito.