Categoria: Direito Imobiliário

A prevenção à disseminação do Covid-19 nos condomínios

Viver um período de pandemia na gestão condominial, significa, para o síndico, assumir um papel de responsabilidade muito maior do que os tradicionais três “S”’ – saúde, segurança e sossego – e bons costumes.

É ao síndico que compete cumprir e fazer cumprir a convenção, regimento interno e decisões da assembleia (Art. 1.348, IV do CC), bem como é dever dos condôminos não utilizar as partes comuns de maneira prejudicial ao sossego, salubridade e segurança dos possuidores, ou aos bons costumes (Art. 1.336, IV do CC) – grifamos.

Diante das formas de contaminação que vem sendo explicitadas amplamente pelas autoridades, vamos abordar algumas providências imediatas, quais sejam, (i) o controle de acesso, (ii) a orientação da equipe de colaboradores, (iii) a higienização das áreas comuns de convívio coletivo, (iv) a rotina da administração do condomínio (v) assembleias e (vi) cuidado com pessoas no grupo de risco.

No controle de acesso, o mais indicado é instalar estações para uso de álcool gel em diversos pontos a fim de evitar aglomerações para o uso. Isso possibilita que os moradores que porventura se esqueçam de fazer a higienização das mãos em um ponto, encontrem outro em seguida. A entrada principal do edifício, o hall dos elevadores, playground e qualquer outro espaço que sirva de acesso da rua para a unidade deve estar bem abastecido e sinalizado.

O treinamento da equipe de portaria é boa prática visando orientar a higienização de moradores, visitantes, prestadores de serviços e, sobretudo, de entregadores – agentes extremamente expostos à contaminação pela natureza de sua atividade.

Como o vírus se transmite principalmente pelas mãos, deve-se implementar uma rotina com maior frequência de limpeza em locais chave, tais como: botoeiras de elevadores, corrimãos de escadas e rampas, maçanetas de portas de lixeiras, elevadores e escadas, grades dos portões de acesso, entre outros, a depender da estrutura física de cada edificação.

O mobiliário usado em condomínio normalmente fica posicionado para proporcionar um convívio mais próximo das pessoas, o que nesse momento deve ser evitado. Portanto, sempre que possível, deve-se removê-los dos locais de espera – playgrounds, hall de elevadores, portarias, piscina, salões de festas ou jardins – visto que os pontos de aglomeração contribuem para a disseminação do COVID-19. Academia, parquinhos, piscina, salão de festa, sauna e outros devem preferencialmente ser fechados. Restaurante, apenas na modalidade delivery e fechaduras com acionamento por digital devem ser desligadas. Em relação aos elevadores o uso deve ser consciente, cedendo prioridade aos idosos

Muitas convenções preveem assembleias ordinárias para a segunda quinzena de março. A realização destas reuniões vai contra todas as medidas de segurança impostas.  Contudo, existe um fato sobre o qual ainda não há um posicionamento oficial das autoridades, que é o travamento automático, pelas instituições financeiras, da conta bancária do condomínio em caso de expiração do mandato do síndico. Para continuidade do serviço, os bancos exigem a apresentação de uma ata de assembleia.

A realização de assembleias virtuais seria o mais recomendável, porém, a ausência de normatização e de aparato eletrônico de amplo acesso, torna essa medida suscetível de nulidade. Uma solução provisória seria fazer uma assembleia com apenas um item objetivando uma prorrogação extraordinária do mandato do síndico por trinta dias para solucionar esses problemas administrativos. Reunião rápida e sem maiores consequências para os ausentes.

Os idosos são os mais vulneráveis e necessitam de ajuda, pois não devem sair de casa. Como têm mais dificuldades para fazer compras por meio digital, cabe a comunidade oferecer ajuda, realizando compras e outros afazeres. A solidariedade, como um dos objetivos fundamentais da República, não pode ser apenas um enfeite no texto constitucional, que prevê no artigo 3º: “Constituem objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil: I – construir uma sociedade livre, justa e solidária;”

As orientações acima não dispensam a consulta de um advogado especializado em direito condominial, bem como de um profissional da área de saúde para a necessária adaptação a cada condomínio.

 

Artigo escrito por Luis Arechavala e Marisa Dreys

Advogados do Escritório Arechavala Advogados.

As consequências criminais por corte no fornecimento de água do condômino inadimplente

Embora pouco falado no âmbito condominial, o direito penal tem estado cada vez mais presente no dia-a-dia de síndicos e moradores. É dever do síndico manter as contas em dia e exigir dos moradores o adimplemento das cotas condominiais. Entretanto, é preciso que isso seja feito dentro dos limites impostos pela lei.

Assim, não podem ser adotadas medidas vexatórias ou que, de qualquer forma, atinjam a honra e imagem do morador inadimplente. Por exemplo: vedar que o mesmo frequente as áreas comuns, a piscina ou mesmo cortar o fornecimento de água à unidade são opções arbitrárias e ilegais.

Especialmente no caso do corte ao fornecimento de água, está-se privando os moradores de direito fundamental, atingindo a dignidade humana, mesmo com aprovação da assembleia. O corte do fornecimento de água é medida privativa do poder público de acordo com a Lei 8987/95 e não pode ser feito através da administração do condomínio.

Em caso de atraso de cotas condominiais, o Código Civil, em seu artigo 1336 prevê sanção de ordem pecuniária, ficando totalmente afastada qualquer possibilidade que vise restrição a direito fundamental. Caso assim não seja, poderá haver consequências cíveis criminais tanto para o síndico, quanto para o condomínio.

Neste sentido, é necessário especial cuidado para com os condôminos da terceira idade. Isto porque o Estatuto do Idoso (Lei 10.741, de 01/10/2003), que adota a doutrina de proteção integral, no âmbito penal implementou tipos penais autônomos destinados à tutela da vida, integridade corporal, saúde, liberdade, honra, imagem e patrimônio do idoso. Entre os crimes previstos no estatuto, o art.99, que visa proteger a vida e a saúde do idoso, merece destaque:

Art. 99. Expor a perigo a integridade e a saúde, física ou psíquica, do idoso, submetendo-o a condições desumanas ou degradantes ou privando-o de alimentos e cuidados indispensáveis, quando obrigado a fazê-lo, ou sujeitando-o a trabalho excessivo ou inadequado:

Pena – detenção de 2 (dois) meses a 1 (um) ano e multa.

§ 1o Se do fato resulta lesão corporal de natureza grave:

Pena – reclusão de 1 (um) a 4 (quatro) anos.

§ 2o Se resulta a morte:

Pena – reclusão de 4 (quatro) a 12 (doze) anos.

Assim, por exemplo, cortar a água de apartamento com idosos como forma de pressionar o pagamento de cotas em atraso, pode implicar na responsabilização penal do administrador do condomínio, nos moldes do artigo supramencionado.

PENAL E PROCESSUAL PENAL. APELAÇÃO CRIMINAL. ART. 99 DO ESTATUTO DO IDOSO. MATERIALIDADE E AUTORIA DEVIDAMENTE COMPROVADAS. CARACTERIZAÇÃO DO DELITO. SUFICIENTE A MERA EXPOSIÇÃO DO IDOSO À CONDIÇÃO DESUMANA OU DEGRADANTE OU PRIVAÇÃO DE ALIMENTOS E CUIDADOS INDISPENSÁVEIS. PROVA TESTEMUNHAL DEIXOU ASSENTE TAIS SITUAÇÕES. VERSÃO DO ACUSADO QUE NÃO SE COADUNA COM AS DEMAIS PROVAS DOS AUTOS. SUSPENSÃO DA PENA DE MULTA. IMPOSSIBILIDADE. PARTE DO PRECEITO SEDUNDÁRIO DO TIPO PENAL. ESPÉCIE DE PENA. ISENÇÃO DO PAGAMENTO DAS CUSTAS PROCESSUAIS. MATÉRIA AFETA AO JUÍZO DAS EXECUÇÕES PENAIS SOB PENA DE SUPRESSÃO DE INSTÂNCIA. ART. 12 DO ESTATUTO DO DESARMAMENTO. DELITO DE PERIGO ABSTRATO. PRECEDENTES DO STJ. DOSIMETRIA DA PENA. AVALIAÇÃO IDÔNEA. REPRIMENDA DENTRO DOS PARÂMETROS DE PROPORCIONALIDADE. SENTENÇA MANTIDA PELOS SEUS PRÓPRIOS FUNDAMENTOS. APELO NÃO PROVIDO. DECISÃO UNÂNIME.

(TJ-PE – APR: 5085076 PE, Relator: Eudes dos Prazeres França, Data de Julgamento: 28/08/2019, 3ª Câmara Criminal, Data de Publicação: 04/09/2019).

Artigo escrito por Marisa Dreys.
Advogada do Escritório Arechavala Advogados

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Referências bibliográficas

ANDREUCCI, Ricardo Antônio https://emporiododireito.com.br/leitura/os-crimes-do-estatuto-do-idoso-por-ricardo-antonio-andreucci

BASTOS, João José Caldeira. Maus-tratos: interpretação do Código Penal e confronto com o delito de tortura. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 13n. 181318 jun. 2008. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/11397. Acesso em: 20 jan. 2020.

DIWAN, Alberto. https://albertodiwan.jusbrasil.com.br/artigos/194559195/breves-consideracoes-acerca-dos-aspectos-criminais-do-estatuto-do-idosoAcesso em: 20 jan. 2020.

ANDREUCCI, Ricardo Antôniohttps://emporiododireito.com.br/leitura/os-crimes-do-estatuto-do-idoso-por-ricardo-antonio-andreucci

NUCCI, Guilherme. http://www.guilhermenucci.com.br/artigo/o-respeito-ao-idoso-e-o-crimeAcesso em: 20 jan. 2020.

ZAIM, Miguel. https://miguelzaim.jusbrasil.com.br/artigos/718799004/da-responsabilidade-civil-e-criminal-do-sindicoAcesso em: 20 jan. 2020.

Condomínio que trata esgoto tem isenção ou desconto junto a CEDAE

A prestação dos serviços de fornecimento de água potável e tratamento do esgoto são essenciais, conforme art. 10, I, da Lei 7783/89, vejamos.

Art. 10 São considerados serviços ou atividades essenciais:

I – tratamento e abastecimento de água; produção e distribuição de energia elétrica, gás e combustíveis;

Assim, na forma do art. 22 do Código de Defesa do Consumidor, devem ser ofertados de forma adequada e contínua pelas concessionárias de serviço público.

O tratamento do esgoto sanitário, especificamente, constitui-se de 4 etapas distintas: coleta, transporte, tratamento e disposição final do esgoto. No entendimento do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro, se o Poder Público não disponibiliza todas as etapas do esgotamento sanitário, não há efetiva prestação do serviço.

Assim, na hipótese de determinado condomínio possuir estação de tratamento de esgoto particular, realizando, por conta própria, todas ou algumas das etapas de coleta e tratamento, há possibilidade de restituição, em dobro, das tarifas pagas indevidamente, cujo prazo prescricional é de dez anos.

Neste sentido, o julgado abaixo:

0016972-59.2013.8.19.0204 – APELAÇÃO

Des(a). MARCELO ALMEIDA – Julgamento: 07/11/2018 – VIGÉSIMA QUARTA CÂMARA CÍVEL

CEDAE. COBRANÇA DE TARIFA DE ESGOTO.
Empresa ré que não presta todas as etapas do esgotamento sanitário. Sentença de procedência parcial, para condenar a ré a: (a) se abster de realizar cobranças a título de tarifa de esgoto em sua integralidade, enquanto não houver estação de tratamento, devendo ser limitada a cobrança a 50% do valor, sob pena de multa equivalente ao montante indevidamente pago; (b) restituir ao autor, na forma simples, R$1.247,87 cobrados indevidamente a título de tarifa de esgoto, desde novembro de 2007 a julho de 2012.

LAUDO PERICIAL CONCLUSIVO ACERCA DA AUSÊNCIA DE QUALQUER TIPO DE TRATAMENTO DOS EFLUENTES SANITÁRIOS, SENDO DESPEJADOS DIRETAMENTE NA GALERIA DE ÁGUAS PLUVIAIS. A TARIFA COBRADA DEVE CORRESPONDER AO SERVIÇO SANITÁRIO EFETIVAMENTE PRESTADO. VERIFICA-SE, IN CASU, QUE A COBRANÇA DE TAL SERVIÇO DEVERÁ EQUIVALER À 50% DA PRESTAÇÃO INTEGRAL. DEVOLUÇÃO DO VALOR INDEVIDAMENTE PAGO PRESCRIÇÃO DECENAL

Por fim, em quaisquer dos casos, é necessária a realização de perícia no local, a fim de se atestar se e como o esgoto sanitário está sendo tratado.

 

Artigo escrito por Caroline Alves.
Advogada do Escritório Arechavala Advogados

Anotações sobre o fiador no contrato de locação por prazo indeterminado

Conforme preceitua o artigo 39 da Lei de locações (8.245/91), salvo disposição contratual em contrário, qualquer das garantias da locação se estende até a efetiva devolução do imóvel, ainda que prorrogada por prazo indeterminado. Contudo, no caso da garantia locatícia ser através de fiador, a responsabilidade deste somente se estende até a entrega das chaves, se no contrato houver previsão expressa nesse sentido. É o que preceitua a Súmula nº 134 do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro e precedentes jurisprudenciais, in verbis:

SÚMULA 134/TJRJ. “Nos contratos de locação responde o fiador pelas obrigações futuras após a prorrogação do contrato por prazo indeterminado se assim o anuiu expressamente e não se exonerou na forma da lei.”

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APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE DESPEJO C/C COBRANÇA. OBRIGAÇÃO SOLIDÁRIA DOS FIADORES. CONTRATO POR TEMPO DETERMINADO. PRORROGAÇÃO AUTOMÁTICA. APLICAÇÃO DA LEI 8245/91. INAPLICABILIDADE DA SÚMULA 214 STJ. Fiador que continua responsável pela dívida do locatário constituída após a prorrogação por prazo indeterminado do contrato de locação, desde que haja cláusula prevendo sua responsabilidade até a entrega das chaves. Ausência de pedido de exoneração da condição de fiador dos apelantes durante o período que o contrato vigorou por tempo indeterminado. (…) (TJRJ – 0033691-64.2009.8.19.0202 – APELAÇÃO – Des(a). CRISTINA TEREZA GAULIA – Julgamento: 23/07/2019 – QUINTA CÂMARA CÍVEL) – grifos nossos.

 

Estando o contrato por prazo indeterminado, ainda que haja cláusula expressa em contrato prevendo a extensão de sua responsabilidade até a entrega das chaves, pode o fiador  se exonerar da fiança, desde que manifeste expressamente sua intenção mediante notificação resilitória. Este é o entendimento:

…) 2. Com o julgamento dos EREsp 566.633/CE, ficou pacificado no âmbito do STJ a admissão da prorrogação da fiança nos contratos locatícios prorrogados por prazo indeterminado, contanto que expressamente prevista no contrato (v.g., a previsão de que a fiança subsistirá ‘até a entrega das chaves’). 3. Todavia, a jurisprudência consolidada apreciou demandas à luz da redação primitiva do artigo 39 da Lei do Inquilinato (Lei 8.245/91). Com a nova redação conferida pela Lei nº 12.112/09, para contratos de fiança firmados a partir de sua vigência, salvo disposição contratual em contrário, a garantia, em caso de prorrogação legal do contrato de locação por prazo indeterminado, também prorroga-se automaticamente (ope legis), resguardando-se, durante esse prazo, a faculdade de o fiador de exonerar-se da obrigação mediante notificação resilitória. 4. No caso, o contrato foi firmado 5/FEV/2008, sendo anterior à vigência da Lei nº 12.112/09, de modo que a prorrogação do contrato de locação só poderia implicar a prorrogação da fiança no caso de expressa pactuação a respeito no contrato acessório, o que existia. Súmula nº 83/STJ. (…) (AgInt nos EDcl no REsp 1559105/MG – Relator Ministro Luis Felipe Salomão. Julgamento: 16/11/2017. QUARTA TURMA – STJ) – grifamos.

Frisa-se que, uma vez notificado o locador da intenção de desoneração, os efeitos da fiança ainda permanecem durante 120 dias (art. 40, X, Lei 8.245/91).

Por fim, liberado o fiador, salienta-se que, o locador poderá exigir nova garantia locatícia no prazo de 30 dias, sob pena de desfazimento da locação (§ único do artigo 40 da Lei do inquilinato), destacando-se que a falta de garantia enseja na possibilidade de despejo com liminar, na forma do art. 59, §1º, VI, da Lei.

 

Escrito por Luis Arechavala e Ioná Cytrynbaum
Advogados do Escritório Arechavala Advogados