Categoria: Direito Imobiliário

Artigo - Fechamento de varanda por cortina de vidro

Fechamento de varanda por cortina de vidro

Código Civil, em seu artigo 1.336, inciso III, e o art. 10 da Lei n° 4.591/64 proíbem qualquer alteração na fachada do prédio. Tais dispositivos visam impedir modificações que impliquem prejuízo estético, impactando negativamente na harmonia do prédio. Dessa forma, para o condômino promover a modificação exige-se o quórum de unanimidade (art. 10, § 2º, da Lei 4.591/64).

Nesta seara, entra em discussão a questão das cortinas de vidro retráteis e se a colocação destas implicaria em alteração da fachada.

Sobre essa questão, o Município do Rio de Janeiro promulgou a Lei Complementar nº 145/2014 fixando as condições a serem observadas para o fechamento de varandas nas edificações residenciais, a fim de possibilitar proteção contra intempéries, tais como poeiras, barulhos, chuva, insetos, etc.

Sobre o tema, a jurisprudência do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro é consolidada no sentido de que a colocação de cortinas de vidro retráteis nas varandas de apartamentos não configura alteração de fachada, desde que: (i) não sejam fechadas do chão ao teto; (ii) sejam respeitadas as exigências legais (LC nº 145/2014); (iii) sejam observadas as disposições contidas na Súmula 384 do TJRJ; e (iv) possuam ART; e (v) cumpram os parâmetros das normas ABNT (ABNT NBR 16259:2014), a saber:

“(…) INSTALAÇÃO DE CORTINA DE VIDRO. POSSIBILIDADE. INEXISTÊNCIA DE VIOLAÇÃO À LEGISLAÇÃO MUNICIPAL. ENTENDIMENTO CONSOLIDADO DESTE TRIBUNAL. ENUNCIADO 384. 1 – A instalação das “cortinas de vidro” não importa em alteração de fachada do edifício, haja vista que não corresponde a fechamento ou envidraçamento definitivos de varanda do chão ao teto. 2 – Desta maneira, a utilização do sistema de envidraçamento retrátil de varandas não viola a legislação municipal. 3 – E nos termos do Enunciado 384 da Súmula de Jurisprudência deste Tribunal, sendo executada por profissional devidamente registrado no Conselho Regional de Engenharia – CREA, ou no Conselho de Arquitetura e Urbanismo do Rio de Janeiro – CAU/RJ, não configura obra a depender de licenciamento urbanístico, desde que não implique em transformação da varanda em um novo cômodo habitável da unidade. 4 – MANUTENÇÃO DA SENTENÇA.” (TJRJ – 0387728-76.2015.8.19.0001 – REMESSA NECESSARIA – Des(a). MILTON FERNANDES DE SOUZA – Julgamento: 16/04/2019 – DÉCIMA NONA CÂMARA CÍVEL)

Destaca-se, ainda, a recente a Lei complementar 198/2019 que tem por escopo disciplinar a elaboração de projetos, construção e modificação de edificações no Município do Rio de Janeiro, por agente particular ou público e, especificamente seu artigo 8º, §10º, o qual permite o fechamento das varandas ali disciplinadas, sem necessidade de licenciamento, desde que atendidos os requisitos da LC 145/2014, quais sejam: (I) painéis de vidro totalmente retráteis instalados sem esquadrias; (II) o fechamento da varanda não poderá resultar em aumento real da área da unidade, nem será admitida a incorporação da varanda, total ou parcialmente, aos compartimentos.

Vale ressaltar que a ABNT NBR 16259 exige que seja realizado cálculo estrutural de todo o edifício, a fim de se dispor da possibilidade de peso exato a ser acrescentado ao prédio, calculando a carga extra da cortina de vidro e o número de sacadas que a receberão, de modo a assegurar que a estrutura predial dispõe de condições necessárias para o projeto.

Outro ponto importante a saber sobre a instalação de cortina de vidro retrátil é se importaria em aumento de área para fins de acréscimo da cobrança de IPTU. Sobre tal tema a jurisprudência se consolida no sentido de que a vedação da varanda não compromete o cálculo do IPTU, uma vez que a área já é considerada para fins de cobrança, conforme previsto no Decreto 14.327/1995, em seu art. 20, inciso II. Vejamos:

CORTINA DE VIDRO. I.P.T.U. MAIS VALIA. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. SUSPENSÃO DA COBRANÇA. Agravo de Instrumento. Ação civil pública. Deferimento de pleito de tutela antecipada para que o ente público suspenda a cobrança de “mais valia” dos imóveis que dispunham de varanda com cortina de vidro retrátil. Reiterados precedentes deste TJ/RJ, no sentido de que a instalação de cortina retrátil não induz aumento de área edificada, a justificar alteração na forma de cálculo do IPTU. Desnecessidade do exame da arguição de inconstitucionalidade da lei complementar que assim estabeleceu, para os fins e limites deste agravo. Recurso a que se nega provimento. (TJRJ – 0009944-65.2016.8.19.0000 – AGRAVO DE INSTRUMENTO – Des(a). JESSÉ TORRES PEREIRA JÚNIOR – Julgamento: 27/04/2016 – SEGUNDA CÂMARA CÍVEL)

Portanto, o condômino que se enquadrar nas condições acima expostas, não necessita de autorização da assembleia, e tampouco está sujeito a aumento no valor do IPTU.

Diante disto, uma vez que não pode impedir, recomenda-se ao condomínio que regulamente, através de uma assembleia, a padronização da colocação das cortinas.

 

Escrito por Luis Arechavala e Ioná Cytrynbaum
Advogados do Escitório Arechavala Advogados

* Obras em condomínio é um dos temas do próximo Diálogos Jurídicos que vai ocorrer esta sexta-feira, 16 de agosto, na Av. Rio Branco, 257 – 2º andar.
Inscrições e informações: info@arechavalaadvogados.com

Bem de família

A família é a base da sociedade. Por tal motivo, nossa Constituição Federal atribui a ela especial proteção. Do mesmo modo, a residência familiar também foi dotada de atenção especial por parte do legislador.

O bem de família é conceituado pelo Código Civil, em seu art. 1.712, como sendo o “prédio residencial urbano ou rural, com suas pertenças e acessórios, destinando-se em ambos os casos a domicílio familiar”. Conceituando-se de forma mais simples, é o imóvel utilizado como residência por um núcleo familiar.

O objetivo desse instituto é proteger não só a entidade familiar, mas também tutelar o direito à moradia (Art. 6º, C.F.). Logo, são muito restritas as hipóteses em que um bem de família possa ser levado à penhora para pagamento de dívida.

Atualmente, as hipóteses em que o imóvel familiar pode ser penhorado estão previstas no art. 3º da lei 8.009, de 29 de março de 1990. De forma resumida, o bem de família pode ser penhorado somente para o pagamento: (i) do financiamento destinado à aquisição do imóvel; (ii) da dívida de pensão alimentícia; (iii) dívidas advindas do próprio imóvel (IPTU, condomínio, etc); (iv) de hipoteca que recaia sobre o imóvel; (v) de obrigação decorrente de fiança concedida em contrato de locação.

Assim como ocorre nos demais casos de restrição de direitos, tais hipóteses em que o bem de família pode ser penhorado nunca devem ser interpretados de forma extensiva. Nesse sentido, veja-se o enunciado de nº 364 da súmula do Superior Tribunal de Justiça:

O conceito de impenhorabilidade de bem de família abrange também o imóvel pertencente a pessoas solteiras, separadas e viúvas.

Ou seja, por família não se entende necessariamente uma coletividade de pessoas, de modo que tal direito persiste mesmo após o divórcio, morte do cônjuge, separação, etc:

RECURSO ESPECIAL. DIREITO CIVIL. EXECUÇÃO. EMBARGOS DE TERCEIROS. PENHORA INCIDENTE SOBRE IMÓVEL NO QUAL RESIDEM FILHAS DO EXECUTADO. BEM DE FAMÍLIA. CONCEITO AMPLO DE ENTIDADE FAMILIAR. RESTABELECIMENTO DA SENTENÇA.

1. “A interpretação teleológica do Art. 1º, da Lei 8.009/90, revela que a norma não se limita ao resguardo da família. Seu escopo definitivo é a proteção de um direito fundamental da pessoa humana: o direito à moradia” (EREsp 182.223/SP, Corte Especial, Rel. Min. Humberto Gomes de Barros, DJ 6/2/2002).

2. A impenhorabilidade do bem de família visa resguardar não somente o casal, mas o sentido amplo de entidade familiar. Assim, no caso de separação dos membros da família, como na hipótese em comento, a entidade familiar, para efeitos de impenhorabilidade de bem, não se extingue, ao revés, surge em duplicidade: uma composta pelos cônjuges e outra composta pelas filhas de um dos cônjuges. Precedentes.

3. A finalidade da Lei nº 8.009/90 não é proteger o devedor contra suas dívidas, tornando seus bens impenhoráveis, mas, sim, reitera-se, a proteção da entidade familiar no seu conceito mais amplo.

4. Recurso especial provido para restabelecer a sentença.

(REsp 1126173/MG, Rel. Ministro RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA, TERCEIRA TURMA, julgado em 09/04/2013, DJe 12/04/2013)

 

Importante notar, ainda, que as decisões do STJ sobre o tema ressaltam o caráter cogente/obrigatório da proteção do bem de família, de modo que ao titular deste benefício não é sequer permitida a renúncia:

AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO MONITÓRIA. CHEQUE PRESCRITO. PENHORA DE BEM DE FAMÍLIA. IMPENHORABILIDADE ABSOLUTA.

1. A proteção conferida ao instituto de bem de família é princípio concernente às questões de ordem pública, não se admitindo nem mesmo a renúncia por seu titular do benefício conferido pela lei, sendo possível, inclusive, a desconstituição de penhora anteriormente feita.

2. A jurisprudência do STJ tem, de forma reiterada e inequívoca, pontuado que o benefício conferido pela Lei 8.009/90 trata-se de norma cogente, que contém princípio de ordem pública, e sua incidência somente é afastada se caracterizada alguma hipótese descrita no art. 3º da Lei 8.009/90, o que não é o caso dos autos.

3. A finalidade da Lei 8.009/90 não é proteger o devedor contra suas dívidas, mas visa à proteção da entidade familiar no seu conceito mais amplo, motivo pelo qual as hipóteses de exceção à impenhorabilidade do bem de família, em virtude do seu caráter excepcional, devem receber interpretação restritiva.

4. Agravo regimental não provido.

(AgRg no AREsp 537.034/MS, Rel. Ministro RAUL ARAÚJO, QUARTA TURMA, julgado em 26/08/2014, DJe 01/10/2014)

Diante desses contornos, torna-se fácil notar a importância que a moradia familiar ganhou ao longo dos últimos anos. Até mesmo o requisito de que a família more no imóvel tido como bem de família já foi mitigado pelo STJ, conforme o enunciado nº 486 de sua súmula:

É impenhorável o único imóvel residencial do devedor que esteja locado a terceiros, desde que a renda obtida com a locação seja revertida para a subsistência ou a moradia da sua família.

Tamanha proteção advém da intenção do legislador de que nenhuma família seja alijada de um mínimo existencial, de modo que a dignidade da pessoa humana integrante de um núcleo familiar seja minimamente protegida.

 

Portanto, podemos concluir que o bem de família é verdadeira questão de ordem pública, de modo que sua proteção é imposição do Estado, como reflexo de uma garantia constitucionalmente estabelecida, e não uma opção do beneficiário ou proteção ao devedor.

Condomínio – cobrança antes da entrega das chaves

A cobrança de taxas condominiais, impostos e demais encargos sobre determinado imóvel, antes da entrega das chaves aos moradores, é conduta abusiva.

 

Tal prática, embora recorrente, contraria a jurisprudência mantida pelo Superior Tribunal de Justiça, que consolidou o seguinte entendimento quando da apreciação do Recurso Especial  nº 1.297.239 – RJ:

 

“Somente a existência de relação material com o bem, a qual se inicia mediante a emissão na posse, permite que o comprador exerça domínio direito sobre o imóvel, gerando a obrigação ao pagamento do condomínio”.

 

Assim, o pagamento das cotas condominiais, pelo período anterior à posse no imóvel pelo adquirente /comprador, é de responsabilidade da construtora/incorporadora.

 

O repasse deste ônus aos compradores que ainda não receberam as chaves do imóvel dá azo ao ressarcimento dos valores pagos.

Condomínio pago pelo inquilino sem passar pelo proprietário

Os condomínios que sofrem com inadimplementos recorrentes das taxas condominiais têm uma nova perspectiva.

A partir de decisão recente em sede de Recurso Especial, o Superior Tribunal de Justiça reconheceu a possibilidade dos inquilinos pagarem as cotas condominiais diretamente às administradoras de condomínio, sem que isso configure ilegalidade ou inadimplemento em relação aos proprietários do imóvel.

O caso que deu origem a decisão foi oriundo de ação de cobrança contra construtora proprietária de expressiva quantidade de unidades de um mesmo condomínio que chegou a acumular débito de quase R$ 500.000,00 (quinhentos mil reais) em cotas vencidas. A proprietária recebia os valores de seus inquilinos, contudo, não efetuava o devido repasse à administradora, que argumentou diante da situação não ter condições de cumprir as obrigações básicas do condomínio.

O pedido da administradora foi acolhido liminarmente sob o fundamento utilizado na garantia de que os valores pagos fossem efetivamente utilizados para o pagamento das contas do condomínio, assim o pagamento direto afastaria a obrigação do proprietário do imóvel.

O STJ, por sua vez, utilizou-se de regra prevista no Código de Processo Civil (art. 671 do CPC de1973, correspondente ao art. 855 do Novo CPC de 2015), que permite ser penhorado crédito do devedor com terceiros. Com isso, entendeu no sentido de que os inquilinos, devedores da Construtora-proprietária, que é devedora do Condomínio, poderão pagar diretamente a ele.

Vale frisar que a decisão abre precedente interessante contra proprietário desidioso, permitindo o pagamento direto pelos inquilinos.